segunda-feira, 27 de fevereiro de 2006

Tem Nome de Árvore Mas Não é Árvore

os topónimos com nome de animais podem não ser, na realidade, nomes de animais (ou zoónimos), mas antes evoluções convergentes de palavras com significado diferente daquele que parecem ter hoje. "boi", "carneiro","lobo" são apenas alguns desses exemplos. o mesmo se passa com topónimos que hoje parecem nomes de árvores (ou fitónimos). alguns já nós encontrámos pelo caminho, como "carvalho" e "pereira".
aparecem outros, como "amoreira", "castanheira", "figueira", "oliveira", "pereira", "sobreira".
são muito frequentes, quer em Portugal quer na Galiza.

muito boa gente tem caído na esparrela de interpretar estes por aquilo que eles parecem, sem ter em conta que muitos outros lugares mereciam o mesmo nome com muito mais propriedade, se o topónimo tivesse o significado que parece ter.

Aboboreira (topónimo associado a elevações, dá nome a várias serras)
Amoreira (por "A Moreira". ver "Moreira")
A Nogueira (Gz.) (ver "Nogueira")
As Moreiras (Gz.)
As Nogueiras (Gz.)
As Nogueirinhas (Gz.) - graf. altern.: "As Nogueiriñas"
Aveleira (topónimo associado a elevações, dá nome a várias serras)
Carvalho (topónimo associado a elevações, dá nome a várias serras)

Castanheira (o nome da árvore é "castanheiro" e não "castanheira". a localização das "Castanheiras" que eu conheço é no início de encostas, com um rio ou ribeiro ao fundo. existe o topónimo "Costaneira", frequente em Portugal e na Galiza, com significado semelhante. são duas formas da mesma palavra. na toponímia castelhana há "La Castaña", por "la costaña", isto é, "uma terra que fica na encosta")

Castanheira de Pera
Castanheira do Ribatejo
Castanheira do Vouga
Castanheiro
Costaneira (Pt. e Gz.) - ver "Castanheira"
Costaneiras
Estrada da Castanheira

Figueira (?) (Pt., Gz. e Br.) (em francês, o nome da árvore é "figuier" e o topónimo é "figuière". no entanto, existe um consenso esmagador em todos os países de língua românica sobre o significado deste topónimo: árvore dos figos. as "figueiras" que eu conheço são lugares planos, habitualmente em cima de elevações. na falta de figueiras a sério, estes lugares estão associados a figueiras lendárias, o que é próprio de etimologias ditas "populares", elaborações a posteriori mais ou menos imaginárias. por outro lado, a tese segundo a qual "Figueira da Foz" será um pleonasmo - "abertura da boca" - tem um porém: a "abertura" - fagaria - só seria aplicável a essa Figueira e sabe Deus com que esforço. mas tem um mérito: procura o significado fora da botânica).
na Catalunha, ao lado dos topónimos "Figueres" existe o topónimo "Figa".
creio que a decifração deste topónimo poderá passar pelo tronco comum aos verbos "ficar" e "fixar"- no sentido de "assentar", "estabelecer morada permanente" (lat. figo, figere, fixi, fictum). teria, pois, um significado equivalente ao de "Póvoa". e seria um topónimo parente dos que contêm o vocábulo "fita", como "Perafita". voltarei a este assunto.

Figueira da Azóia
Figueira da Foz
Figueira de Castelo Rodrigo
Figueira de Cavaleiros
Figueira de Lorvão
Figueira do Guincho
Figueira do Mato
Figueira Redonda
Figueiras de Cima
Figueiró (diminuit. de "Figueira")
Figueiroa (Gz.)
Figueiroá (Gz.)
Figueiró dos Vinhos
Figueiros (Gz.)

Ladeira do Pinheiro (topónimo esclarecedor: é necessário uma "ladeira" para trepar ao "pinheiro")

Macieira (este topónimo costuma ser decifrado como "árvore das maçãs". o que resta explicar é por que razão foram assim designadas estas localidades e não outras possivelmente mais ricas nesse tipo de fruta. tendo em conta o topónimo "Mação", que tem mais a ver com "casas" do que com "maçãs", o mais provável é que "Macieira" signifique "casario")

Macieira de Alcoba
Macieira de Cambra
Macieira da Lixa
Macieira da Maia
Macieira de Sarnes
Montes de Piñeiro (Gz.) - grafia integrada: "Montes de Pinheiro". é um pleonasmo. ver "Pinheiro".

Moreira (lugar onde há casas ou moradias; moraria)

Moreira de Cónegos ( dos cónegos da Colegiada de Stª Maria da Oliveira, Guimarães)

Moreiras
Moreiró (diminut. de "Moreira")

Nogueira (é um topónimo associado a elevações. dá o nome a serras). em Itália, na Calábria, há uma Nocara, a 865m de altitude

Nogueira da Maia
Nogueira da Montanha (é um pleonasmo: "monte da montanha")
Nogueira da Regedoura
Nogueira de Ramuín (Gz.)
Nogueira do Cravo

Nogueiró (diminut. de "Nogueira", está associado a elevações de menor altitude)

O Eido da Nogueira (Gz.)
Oliveira (de "ulveira": lugar úmido, empapado, pantanoso)
Oliveira de Azeméis
Oliveira do Conde

Oliveira do Hospital ("Hospital": Ordem dos Cavaleiros do Hospital ou de S. João de Jerusalém, actual Ordem de Malta)

Oliveira do Mondego
Oliveirinha

O Pereiro (Gz.)
O Piñeiro (Gz.)

Pereira (topónimo associado à existência de pedras ou pedreiras no local)

Pereiro
Pereiró (diminut. de "Pereira")

Pinheirinho

Pinheiro (lugar alto e pedregoso, com "penhascos" ou "penhas". há situações muito particulares em que "pinheiro" é árvore: se se refere às suas características ou ao seu número, como em "Pinheiro Manso" ou em "Três Pinheiros")

Pinheiro da Bemposta - é um lugar elevado, de onde se avista(va) paisagem a perder de vista. apesar da tradição popular, o "pinheiro" é o "pino" (sítio elevado) e não o pinus (árvore)

Pinheiro de Ázere
Pinheiro de Côja
Piñeiriño (Gz.) - grafia integrada: "Pinheirinho"
Piñeiro (Gz.) - grafia integrada: "Pinheiro"

Praia das Maçãs (aqui a praia é "do casario", já que não há maçãs sem macieiras)
Punta Sobreira (Gz.)

Sobreira (como em "Castanheira", há aqui uma subtil mudança de género, já que a árvore é o "sobreiro" e não a "sobreira". assim, o topónimo não deriva de suber - "sôbro", "sobreiro" - , mas sim de supra - "sôbre"). é uma povoação que fica "sôbre" qualquer coisa, uma elevação por exemplo. é equivalente ao topónimo "Sobreposta". no entanto, há quem tenha outras opiniões. que decida a topografia do local!

Sobreira Formosa
Sobreposta (o mesmo que "Sobreira")
Vale de Figueira
Venda do Pinheiro
Vila Nogueira de Azeitão
Vila Nova de Oliveirinha


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2006

Marcos, Malhões e Fronteiras

alguns topónimos imortalizaram limites territoriais, administrativos ou de propriedades, que hoje em dia já não vigoram. mas o nome ficou. o topónimo "Fronteira" refere-se a lugares que confinaram com alguma estabilidade com o império árabe, sendo muito mais frequente na Extremadura e Andaluzia espanholas

Alto do Malhão
Casal do Marco
Casal dos Marcos
Devesa (Pt. e Gz.)
Estremadoiro (Gz.)
Estremadouro
Estremão
Estremo
Extremadoiro (Gz)
Extremo (Pt. e Br.)
Fronteira
Malhanito - diminut. de "Malhão"
Malhão - limite de propriedade rústica
Malhões - plural de "Malhão"
Malhóm (Gz.)- ver "Malhão"
Malhonito - diminuit. de "Malhão"
Marca
Marcão
Marcóm (Gz.)
Marcas
Marco (Pt. e GZ.) - local onde há ou houve um padrão indicativo de limite
Marco de Canavezes (ou Canaveses)
Marco do Distrito
Marcos (Pt. e Gz.)
Marquinha
Marquinho
Mogo (marco de delimitação de propriedade)
Moinho do Malhão
Pedra da Estrema
Pedra do Extremo
Pena Trevinca (Gz.) - ver Comentº de Capeloso
Portela dos Marcos
Praia do Malhão
Quatro Marcos
Salvaterra do Extremo
Três Bispos (Gz.) - ver Comentº de Capeloso
Trevim (do lat. trifini: "três" con-"fins", local onde confluem três limites ou fronteiras... tribais?)

Trevinca (Gz.) - ver Comentº de Capeloso

Vila Verde do Extremo (aqui, "verde" significa "velha")



sobre este assunto pode consultar-se ainda o post "Raias e Fronteiras"


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006

O Padrão

este topónimo, e seus diminutivos, é frequente no Norte de Portugal e na Galiza. refere-se à presença, actual ou no passado, de um ou vários "padrões": pedra erguida, habitualmente de forma cilíndrica regular, com inscrições. em alguns casos serão marcos miliários romanos, marcos cilíndricos de pedra com que eram assinaladas as milhas ao longo do traçado de uma estrada.
(é interessante verificar como em certas regiões, sobretudo na actual fronteira galego-portuguesa do Gerês/Xurés, esses marcos representavam a figura do imperador. assim, naquela zona, sempre que um novo imperador era entronizado colocava-se novo marco ao lado dos anteriores, pelo que em alguns lugares há uma autêntica floresta de marcos miliários na mesma milha).

no Brasil, os topónimos em "Padrão" referem-se aos padrões que eram colocados pelos navegadores portugueses, na época das descobertas.

O Padróm (Gz.) - é a antiga Iria Flavia e terra onde a grande poetisa galega Rosalía de Castro viveu os últimos anos da sua vida, na Casa da Matanza.

Padornelo (Pt. e Gz.) - diminut. de "Padrão"
Padrão da Légua
Padrão de Moreira
Padrãozinho - diminut. de "Padrão". mais recente que "Padornelo" e "Padronelo"

Padrões
Padronelo
Padrones (Gz.)
Padrós - será o caso dos marcos miliários romanos (?)



terça-feira, 21 de fevereiro de 2006

Pedra, Pedrinha, Pedrosa

os topónimos derivados de "pedra" são muito frequentes na Galiza e em Portugal e também aparecem no Brasil. em posts anteriores já encontrámos uma série de topónimos que se reportam à pedra ou às pedras ou ao carácter pedregoso do lugar. simplesmente esses topónimos são anteriores ao latim. estes aqui ou são linguisticamente latinos ou são pós-latinos (românicos ou medievais, ou já galego-portugueses e portugueses). são pois muito mais recentes que os anteriormente referidos - cuja origem e antiguidade se perdem no tempo.
as formas mais antigas, românicas ou romances, sâo habitualmente em "pera" ou "peras", enquanto que a forma mais recente surge em "pedra" ou "pedras".

vejamos os exemplos que seguem:

Armação de Pera
Castanheira de Pera
Eira Pedraça
Eira Pedrinha
Padrela - está por "Pedrela". também é nome de serra
Padrosinho - diminut. de "Padroso"
Padroso (Pt. e Gz.) - está por "Pedroso"
Paralta (ver Peralta)
Pedernais
Pederneira
Pé Dorido - ver Comentº de José Manuel Mota
Pedourido - ver Pedorido
Pedra (Pt.,Gz.e Br.)
Pedraçal
Pedrafita (Pt. e Gz.)- ver "Perafita"
Pedragal
Pedra Letreira
Pedralhos
Pedralva
Pedralvo

Pedra Maria (em Felgueiras, é um vestígio evidente de um ancestral culto das pedras)

Pedrancha ("pedra larga"?)
Pedrão (Pt. e Gz., sob a forma Pedróm)
Pedraria
Pedrarias
Pedrario
Pedras
Pedras Rubras
Pedras Salgadas (pedras de onde emanam águas termais ricas em carbonato de sódio*)
Pedreçal - o mesmo que "Pedraçal"
Pedreda (Pt. e Gz.)
Pedrega
Pedregal (Pt. e Gz.)
Pedrego
Pedregosa
Pedregosinha
Pedregoso
Pedreira
Pedreirinha
Pedrel
Pedricosa
Pedrido - de "pedra", ou variante de Pedorido? ver Comentº de José Manuel Mota
Pedrógão
Pedrogo
Pedrogos
Pedrosa (Pt. e Gz.)
Pedrulha
Pera Boa
Perachão

Pera do Moço (este "Moço" é o mesmo que o "Mouzo" ou "Mouço" galego. parece um pleonasmo)

Peradussa

Perafita ("pedra levantada". o mesmo que "menir" e "anta" ou "arca"?)
Pera Longa ("pedra comprida")
Peralta ("pedra alta". o mesmo que "menir"?)
Pera Velha
Perdiz (Pt. e Gz.) (por "Pedriz")
Perdizes (por "Pedrizes")
Pereira do Campo (pereira = pedreira)
Pereiro

Pereiró - pertence aos topónimos terminados em "ó" [

Peruscalho (Gz.) - um pleonasmo? perus (pedra)+calho (calhau)?
Piedrafita (Gz.) - está por "Pedrafita"?

S. Bento das Peras (monte sobranceiro a Vizela, onde persistem vestígios de um ancestral culto das pedras)

Vilar de Perdizes - ver "Perdizes"


*salgado



domingo, 19 de fevereiro de 2006

O Meu IBSN



para que a publicação electrónica venha um dia a ser equiparada às outras publicações, acabo de aderir tamém ao registo IBSN.
o registo IBSN (Internet Blog Serial Number) surgiu em 2 de janeiro de 2006, em Espanha, como resposta à recusa em atribuir um ISSN (International Standard Serial Number) às publicações na Internet.



adesões conhecidas:


A Tola do Monte
Calidonia
Engalego
Jolorib
NamberGUÁN


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006

Açude, Engenho, Levada, Nora, Presa, Represa


quando alguns homens foram colocados em lugares da terra onde a caça, a pesca ou a simples colheita de frutos e raizes não era suficiente para os alimentar, tiveram que reproduzir, no local onde passaram a viver, as condições ecológicas, animais e vegetais propícias à vida humana. de certo modo, abandonar um mundo de caça, pesca e colheita ao estender da mão, sem outro cuidado nem canseira, para um mundo onde tudo tem de ser feito e criado de raiz e pelo esforço e inteligência do homem, constituíu uma alteração quase tão drástica, senão mais, como aquela que hoje estamos preparando com a possibilidade de alguns seres humanos habitarem temporária ou definitivamente um outro planeta. não sei se a preparação do homem para a aventura agrícola não terá sido alvo de iguais delongas e preparativos. há quem diga que foi a "evolução", sem nos explicar o que isso significa. será o mesmo que dizer que o homem foi à lua ou vai a marte por via da evolução. ficamos na mesma.
houve a necessidade de criar um vestuário. naquelas condições, passar da nudez natural para andar vestido é o mesmo que passar de andar vestido para o uso do escafandro espacial. já nem falo da técnica que foi preciso desenvolver para transformar a lã ou o linho em coisa que se vista.
e a criação de condições ecológicas não se ficou por aí. de simples abrigos naturais ou de pouco esforço de imaginação e confecção foi necessário construir uma cápsula de materias diversos a que se convencionou chamar de "casa". casa essa a que não bastaria ser "casa", pois que teve que ser aquecida ou refrigerada, munida de cozinha, de sítio onde comer e onde dormir, onde alojar o núcleo social mínimo, onde criar os filhos, sei lá.
foi preciso mudar as regras de vida, já que viver em meio hostil não é o mesmo que viver no paraíso.
e houve que mudar o próprio eco-sistema. transplantar animais e plantas do seu mundo livre (selvagem) para um espaço controlado pelo homem (domesticado). tornar fértil o que é árido, tornar familiar o que é bravio. dominar terras, rios, ribeiros e fontes.
a água não nasce onde queremos, não chega onde precisamos dela, não tem sempre o mesmo caudal e a mesma quantidade. é preciso represá-la, guardá-la, distribuí-la, fazer com que o elemento úmido chegue aonde, quando e como for preciso.
foi, sem dúvida, uma grande e contínua revolução tecnológica, mental, cultural, e religiosa tamém. os espíritos cederam o seu lugar aos deuses e depois aos santos.
esta saída do mundo natural para um mundo feito pelo homem haveria, no fim de contas, que multiplicar a raça humana para além do que seria imaginável, levá-la aos lugares mais inóspitos do mundo. tornar o homem o senhor da natureza.
e assim nasceram da imaginação do homem os poços, as cisternas, os fontanários, os açudes, presas ou represas, os caneiros, as levadas, sei lá que mais. quem conhece a ilha da Madeira sabe o esforço que foi necessário para levar para a vertente árida do sul a água que sobrava na vertente norte. foi o mesmo que criar de novo a ilha da Madeira.
evidentemente, uma criação dessa natureza haveria que dar identidade e nome aos lugares. e por isso a toponímia os regista mesmo onde eventualmente já lá não estão.

alguns exemplos:

Açude - palavra de origem árabe (aç-çudd : "represa"), aparece onde chegou a influência deste império. em Portugal, vê-se no centro e no sul. no Norte e na Galiza aparece "Represa" com igual significado.
Azenha - palavra de origem árabe (aç-çania): moinho de roda movido a água
Águas Levadas
Azenha do Pisão
Azenha do Rio
Azenhas do Mar
Caneiro - tem um significado próximo de "levada"
Engenho (no Brasil refere-se habitualmente ao aparelho do açúcar)
Fontão
Fonte
Fontela (Pt. e Gz.) - diminut. de "Fonte". do lat. "fontanela"
Fontenla (Gz.) - o mesmo que Fontela. representa um estadio anterior da passagem do lat. "fontanela" a "fontela"
Lagar
Lagar de Pessegueiro
Lagar de Vara
Lagares da Beira
Levada (Pt., Pt.-Md., Gz.)
Levadinha
Moinho
Moinho d'Água
Moinho de Vento
Moinhos
Muiños (Gz.) (grafia muito discutível)
Nora (os árabes trouxeram do Egito este complexo engenho. o nome, como não podia deixar de ser, é de origem egípcia veiculado pelo árabe. no Norte de Portugal e na Galiza prefere-se o termo Engenho)
Noras
Pisão (ver Post "Pisão, Pisóm, Pisões")
Ponte do Açude
Presa (Pt. e Gz.) - reservatório ou poça onde se retém e guarda a água para rega. o termo árabe correspondente é "albufeira"
Rega
Regadas Novas
Represa - o termo de origem latina para "açude". corresponde ao holandês Dam, como em Amsterdam e Rotterdam.
Sítio da Nora do Velho

nota: sobre "águas de rega" podem consultar esse sítio. sobre as "levadas" da Madeira vejam esse aí







Para Que Serve Um Blogue

confesso que andava um pouco zangado. o blogger não funciona suficientemente bem, nem pouco mais ou menos. de início atribuí-me as culpas, porque, em boa verdade, não nasci na idade da informática. porém, depois de consultar outros blogues constato que esse é um problema e um queixume bastante distribuído pelos blogonautas - o que a bem dizer me retira da classe dos ineptos, pelo menos dos ineptos mais minoritários.
e hoje apetece-me fazer as pazes com o blogue. ele é uma espécie de diário falante. responde aqui e além, dá sugestões, apoia, às vezes até elogia. mas o mais importante é que transporta para lá de todas as fronteiras, irmana com gente semelhante no falar e no pensar, torna o ser humano ubíquo e etéreo, livre deste aqui e deste agora.
e guarda cogitações de longa data, a experiência de gentes e lugares, todas essas coisas guardadas algures no íntimo, sem préstimo por não estarem à disposição de quem as podia querer.

post scriptum: jolorib, soube que sofreu um apagão. recupere rápido. faz falta na blogosfera.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

Rei, Princesa e Capital

receio que este post não tenha muito que ver co'a Toponímia, mas não resisto. afinal de contas, quem sabe se um dia vem a ter. vai fazer 96 anos que Portugal se tornou uma República. visto isso, não lhe devia ser do agrado o sangue azul e respetivos títulos de rei, de príncipe ou princesa. puro engano! afinal, o problema é que todos os portugueses e suas madames gostariam de ser reis, rainhas, príncipes e princesas tamém. e está certo. só um rei é pouco. assim como só uma capital (...e inda por cima Lisboa!). temos de convir que é pouco demais. nós temos vistas largas e gostamos de conhecer as coisas por um nome mais solene. somos um pobo profundamente aristocrata e pergaminhento, que não se conforma co'a apagada e vil tristeza, como dizia um poeta - por sinal demasiado citado pr' o meu gosto.
os brasileiros, claro, em questão de reis e de princesas não nos ficam atrás.

vejam só (prometo aumentar a lista):

A Capital da Chanfana - Miranda do Corvo
A Capital da Lampreia - Penacova
A Capital da Maçã de Montanha - Armamar
A Capital do Frango do Campo - Oliveira de Frades
A Capital do Fumeiro - Vinhais
A Capital do Minho - Braga (alterna com A Cidade dos Arcebispos e A Roma Portuguesa)
A Capital do Móvel - Paços de Ferreira
A Capital do Norte - Porto (alterna com A Invicta)
A Capital do Parapente - Linhares da Beira
A Capital do Queijo da Serra - Celorico da Beira
A Capital dos Dinossauros - Lourinhã
A Capital Universal da Chanfana - Vila Nova de Poiares (veja a receita da Confraria)

A Cidade Berço - Guimarães
A Cidade dos Arcebispos - Braga
A Cidade Invicta - Porto

A Princesa do Alva - Côja
A Princesa do Cávado - Barcelos
A Princesa do Lima - Viana do Castelo
A Princesa do Lis - Leiria

A Rainha dos Cachorros - aqui "cachorro" é hot-dog
A Rainha da Fronteira - Elvas

O Rei da Fruta
O Rei da Pescada
O Rei das Bifanas
O Rei das Farturas
O Rei das Francesinhas
O Rei das Ostras (Br.)
O Rei das Peles
O Rei das Pipocas
O Rei das Sandes
O Rei da Sucata
O Rei do Cabrito
O Rei do Maracujá (Br.)
O Rei dos Azulejos
O Rei dos Blogues (o trono está vago. por enquanto)
O Rei dos Cachorros (hot dogs)
O Rei dos Catálogos (Br.)
O Rei dos Cortinados
O Rei dos Esquentadores
O Rei dos Frangos
O Rei dos Gatos (Br.)
O Rei dos Hamburgers
O Rei dos Leitões
O Rei dos Tapetes (Br.)


bom, mas para que este post tenha algo que ver com Toponímia, aqui vos deixo alguns topónimos em Rainha, Rei e Reis:


Angra dos Reis (Br.) - aqui os "reis" são outros. significa que os portugueses chegaram à região em 6 de janeiro

Caíde de Rei
Caldas da Rainha
Caldas de Reis (Gz.)
Moreira de Rei
Palas de Rei (Gz.)
Pinhal do Rei
Praia d'El-Rei
Serra d'El-Rei
Vila de Rei
Vila Nova da Rainha
Vila Nova de Souto d'El-Rei
Vilar de Rei
Vila Real
Vila Real de Santo António

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

Pisão, Pisóm (Gz.), Pisões

estes topónimos fazem referência a aparelhos, por vezes muito complexos, destinados a pisar azeitonas para fazer azeite. constam de uma construção só aparentemente tosca, em forma de casa, uma grande roda movida pela energia de uma queda de água e um sistema de engrenagens que transmite a força hidráulica à prensa do lagar. estas construções encontram-se na margem de um rio ou ribeiro, num troço propício ao aproveitamento da energia das águas (ver Comentº).

veja-se os seguintes:

Arruda dos Pisões
Outeiro dos Pisões
Pisanito (diminut. de Pisão)
Pisão
Pisãozinhos (diminut. plur. de Pisão)
Pisões
Pisóm (Gz.) - o mesmo que Pisão


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006

Gonça, Gonçalo, Gondar, Gondomar,...

os topónimos em "Gonc-", "Gonç-", "Gond-" e "Gont-" são muito abundantes no noroeste peninsular, sobretudo no Entre-Douro-e-Minho e na Galiza. são de origem germânica, implicam uma atitude guerreira e, pelo seu significado, referem-se a alguém que mereceu distinção em "combate" (gunthi), pelo que terá sido premiado com a posse das terras homónimas. isso quererá dizer que a cada "Gondar" seu combatente, e não tanto o mesmo combatente para senhor de todos os "Gondar" - penso que seria demasiado prémio para um homem só, inda por cima "bárbaro". na Galiza há uma boa meia-dúzia de "Gondar", praticamente tantos como em Portugal a norte do Rio Douro. num deles, o de Guimarães, me tornei gente suficientemente crescida para os combates da vida.
bom, há os "combatentes" e há os "chefes dos combatentes" ou de tribo (gunde-rik): "Gondariz", "Gondoriz" - que, já se vê, são menos abundantes, embora os haja tanto na Galiza como no Norte de Portugal.
no Brasil há topónimos destes, transpostos tanto de Portugal como da Galiza

podemos arrolar os topónimos seguintes:

Gonça
Gonçala
Gonçalinha
Gonçalinho (Pt. e Br.)
Gonçalo (Pt. e Br.)
Gonçalo Bocas ("Bocas" porquê? deveria grafar-se "Gonçalbocas"?)
Gonçalo Velho
Gonçalveiros (povoação de gente oriunda de "Gonçalo"?)
Gonçalves (Pt. e Br.)
Gonçalvinho
Gonce
Gonceiro
Goncinha
Gondã
Gondães (é um genitivo. significa [villa ou quinta] de um tal "Gonta")
Gondaes (Gz.)- o mesmo que Gondães
Gondais - o mesmo que Gondães e Gondaes
Gondão
Gondar (Pt. e Gz.)
Gondarán (Gz.)
Gondarão (Br.) - transposição do "Gondarán" galego
Gondarém (Pt. e Gz.)
Gondarén (Gz.) - o mesmo que Gondarém
Gondar

Gonde - é um genitivo. significa [villa ou quinta ] de um tal "Gonto". há um ribeiro de Gonde, que significará, se não tem outra origem, "o [ribeiro da quinta] de "Gonto"

Gondeiro
Gondeixe

Gondelães - é um genitivo. significa [villa ou quinta] de um tal Gontella

Gondisalves - variante dialectal de "Gonçalves"
Gondivau - "Gundwald": pleonasmo:combate+combate

Gondomar (Pt. e Gz.) - é um genitivo de gund-maro, que deverá ser um título de guerra:
"Cavalo-Combate"


Gondoriz (Pt. e Gz.)
Gonte (Pt. e Gz.)
Gunde - o mesmo que "Gonte"


sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006

Mais um Apagão e Desisto

Isto de blogues tem que se lhe diga. está um home sossegado a escrever o que lhe vem à ideia e...zás! desaparece tudo! é preciso pacência... Ultimatum ao blogger: ou põe isto a funcionar como deve ser, ou... passo a escrever à moda antiga, de papel e lápis!

ponto final.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

Cónego Arlindo Ribeiro da Cunha (1906-1976)


Fará trinta anos a 10 de abril que resolveu partir. digo "resolveu" porque podia ter resolvido seguir os conselhos da medicina. mas nisso ele era como os romanos: não tinha os filhos de Imhotep em grande conta, talvez fossem para ele um pouco menos que charlatães... passaria horas, se tivesse tempo, a contar histórias risíveis dos pobres práticos que, coitados, prescreveriam remédios piores do que as maleitas. mas não foi com isso que me demoveu de seguir a vocação. preferiria que eu fosse alguém nas letras, que tivesse jeito prá escrita e viesse a ser, sei lá, um prémio nobel. mas eu nunca tive muita queda para escrita demorada, nem fiz amigos prestáveis para aquele fim.
semeou, se calhar, uma semente melhor. ele era um manancial inesgotável de sabedoria. dominava a origem das palavras, o nome das terras e a forma de os decifrar, os nomes de família, os brasões, conhecia os caminhos velhos, as calçadas romanas, os marcos miliários, os montes onde podia esgravatar ruína antiga, os ditos e lendas populares e a maneira de os trocar em miúdos. tinha uma enorme biblioteca: era um espaço sagrado, um útero, nela bebi a cultura galega e brasileira, numa época em que a grande maioria dos patrícios desconhecia uma e outra. "airinhos, airinhos aires, airinhos da minha terra"... "minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá. as aves que cá gorjeiam não gorjeiam, como lá"...
fez-me andar em escavações arqueológicas, onde me entranhei de pó, de terra e de fascínio. gostava de mim porque eu era o filho mais velho da irmã dele - um antigo parentesco de excelência.
escreveu A Língua e a Literatura Portuguesa, manual de estudo para os alunos dos seminários e um livro muito seguido do Outro Lado do Atlântico. é também dele uma Gramática Latina que chegou à 7º edição.
além dos livros que escreveu e dos artigos que fazia publicar no Diário do Minho, participou como colaborador assíduo na Grande Enciclopédia Luso-Brasileira e na Enciclopédia Verbo.
nascido em S. Torcato , Guimarães, a 24 de fevereiro de 1906, foi professor do Seminário de Santiago (Seminário Conciliar de S. Pedro e S. Paulo) e cónego do cabido da sé de Braga. tem hoje o seu nome na toponímia urbana da Bracara Augusta. está referenciado na net, na bibliografia sobre a cidade.

(ver também este artigo e este aqui)


*In Memoriam*

Penamacor, Pena Maior, Penamaior (Gz.), Penamocor






são variantes dialectais do mesmo vocábulo composto: Penha Maior, isto é, "Penha Grande", "Penedo Grande".

Óbidos



é outro topónimo que está praticamente intacto, como veio ao mundo. provém do lat. oppidus, que significa "cidade fortificada", "fortaleza". no estado do Pará, no Brasil, há uma Óbidos, que resulta da transposição do topónimo português. a razão do nome salta à vista.
os romanos chamaram "fortaleza" a uma cidade que já lá estava quando eles chegaram

terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

Penedono

este topónimo parece acabadinho de inventar. ainda soa praticamente do jeito que falava quem o inventou: pene-dunu, Pena de Dono, a "penha do castelo". aquele "dono" latinizado na Idade Média deu Pennadedomno, uma inverosímil "penha do senhor".
não obstantemente a evidência fotográfica, ainda há quem acredite mais nas cousas se forem escritas em latim, de preferência o latim macarrónico medieval. é como as afirmações dos textos científicos de hoje: os truismos ditos em inglês, de preferência o dos esteites, passam por elaborações filosóficas de grande profundeza. por mim, sempre me fio mais na linguagem direta dos lugares.

nota: o castelo a que se refere o nome esteve anteriormente no lugar deste, como se compreenderá.

Itacoatiara (Br.) ou a Pedra Letreira (Pt. e Gz.)

pela sua importância, passo a post a questão que me foi colocada pelo amigo Jolorib a respeito de "Itacoatiara", também grafada "Itaquatiara". em língua tupi-guarani significa "pedra letreira", "pedra gravada" ou "pedra pintada" - coisa bem conhecida a norte como a sul do rio Minho. estas pedras, ornamentadas com petroglifos (compreendo a necessidade do termo...), situam-se em lugares outrora sagrados, onde decorriam cerimónias astro-religiosas de iniciação e rituais de passagem. o neófito ou catecúmeno, até aí criança, era instruído nas verdades da tribo e nos segredos do cosmos, do mundo e da vida, passando à categoria de ser humano e adulto depois de integrar esse conhecimento no coração e na cabeça. os rituais impediam que a verdade entrasse por um ouvido e saísse por outro, enraizando-a profundamente no centro das emoções e da afectividade.
os rituais e provas de passagem eram suficientemente difíceis e dolorosas (adolescência) para o assegurar. o neófito morria para a vida anterior, a infância (que quer dizer "a idade em que não se fala" - ou não se tem voz activa), e renascia para uma nova vida, a vida adulta - onde já se fala, porque já se é mestre ou dono de si mesmo.
que esse tesouro de sabedoria não devia ser fácil de adquirir dizem-no as lendas sobre "tesouros escondidos" e "perigos" associados.


na Galiza existe ainda "pedra dos letreiros" e "os letreiros".
aqui bem perto, em Góis, há uma Pedra Letreira à qual se associa esta quadra:



"junto da pedra letreira
há três arcas em carreira.
uma é d'oiro, outra de prata,
outra de peste que mata"






segunda-feira, 6 de fevereiro de 2006

Alba, Alva

é um dos topónimos mais antigos da Europa, e daí a sua presença dispersa um pouco por todo o lado. aparece sob a forma Abla, Alava, Alba, Alba de Tormes, Alba Facência, Alba Longa, Albânia, Alba Pompeia, Albe, Albé, Albion, Alpes, Alva, Alvão, Aube, Île d'Albe, Monte Albano, Mont'Alvão. muitas cidades da Itália etrusca tinham este nome, pelo que o topónimo é forçosamente pré-romano. não faz qualquer sentido fazê-lo provir do latim alba, "branca". significa "colina", "ponto alto", e, secundariamente, "castelo", "forte".

alguns topónimos em Alva.

Alban (Gz.)
Alpes
Alvinha
Barca d'Alva
Barroca d'Alva
Marialva - monte rochoso ou castelo na rocha
Montalvão - pleonasmo: monte-monte
Monte d'Alva
Penalva - castelo da pena
Penalva do Castelo - significa "castelo da pena do castelo"
Pisões de Ribeira d'Alva
Quinta do Alvão
São Pedro d'Alva




sábado, 4 de fevereiro de 2006

Soutos, Soutinhos e Soutelos

até agora tenho dedicado atenção à morfologia, orografia, hidrografia e infraestruturas dos lugares, com um desviozinho pelos hagiónimos ou nomes de santos. é altura de falar de lugares que devam o seu nome à flora que neles medra. vou começar pelos castanheiros, árvores cujo fruto mereceu em tempos a predilecção das gentes do Norte, pelo seu sabor e pela sua ligação às festas dionisíacas do "São Martinho" - em que pontuava o quase saudoso magusto. a castanha foi substituída pela batata, coisa da América, que se fez acompanhar do seu fiel amigo escaravelho. e o castanheiro foi escasseando e recolhendo a espaços cada vez mais reduzidos.
a mata de castanheiros tinha o nome de "soito" ou "souto". daí a persistência de topónimos como esses:

Quinta dos Soutos
Regada do Soito

Santo Varão (???) - este topónimo não está decifrado. a forma anterior de "souto" era "sauto". o lugar pode ter sido um souto de culto ou uma mata sagrada, na margem esquerda do Baixo Mondego

Soito
Solteirão (povoado com gente de Solto?)
Solteiros (gente orinda de Solto?)
Solto (de salto-sauto: souto. topónimo fora de uso)
Soutelinho (Pt. e Gz.) - é duplo diminut. de Souto
Soutelinhos
Soutelino
Soutelio
Soutelo (Pt. e Gz.) - diminut. de Souto
Soutelo de Montes (Gz.)
Soutinho - diminut. de Souto. é mais recente que Soutelo
Soutinhos
Souto (Pt. e Gz.)
Soutocico (Mir.) - diminut. mirandês (asture-leonês) de Souto
Souto da Casa
Souto da Ponte
Souto de Vea (Gz.)
Soutolongo (Gz.)
Soutomaior ou Sotomaior (Gz.) - é aumentat. de Souto. significa "Souto Grande"
Souto Redondo
Soutulho (Pt. e Gz.)
Soutulhos ou Soutullos (Gz.)
Soutulio


Nota: o Souto pode designar tamém um bosque na margem de um rio



ver novo post sobre o assunto aqui

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2006

Tantas Vezes o Cântaro Vai à Fonte...

...que alguma vez deixa lá ficar a asa. mas não é desses cântaros que vou agora falar. vou falar de rochedos especiais, tipo monovolume, visíveis por exemplo na Serra da Estrela. derivam do tema "cant-", "pedra", e não se ficam por Portugal e Galiza. também aparecem na Cantábria, batizando a região, e nas Astúrias. Cantuária (Canterbury), na Inglaterra, é um topónimo da mesma família. em post anterior ("Serras, Montes e Montanhas") já arrolei alguns destes topónimos na variante "cand-".

alguns exemplos:

Canda (Pt. e Gz.)
Candal (Pt. e Gz.)
Cando (Pt. e Gz.)
Candieira
Candosa
Candoso
Cantanhede
Cântara
Cantareira (Pt. e Br.)
Cantareiras
Cantarinha
Cantarinho (Pt. e Br.)
Cantarinhos
Cântaro Grande
Cântaro Magro
Cântaros
Canteira (Gz.)
Canteiras
Canteiro (Pt. e Gz.)
Santo António do Cântaro
Vale de Cântaro